1 de jun. de 2010

viagens

Viagens...

Abro-me à possibilidades,
vem chegando nova estação
Penso em uma noite calma, varandas largas
Da alegria, somente a dose necessária para um dia
Do universo, versos para compor ainda uma poesia
Vem chegando nova estação
No coração, acordes de calma
Na alma, solos de violão
Nos olhos, nenhum compromisso
Apenas a intenção de que ainda que não faça sentido
tentar entender a canção da curva do rio
em toda sua eternidade
em toda sua eternidade
e fartar-me com o que me é proibido
um tanto a mais daquilo
e de tudo que a muitos não faz sentido
no riso calmo que pensam ser insanidade
absorver a canção da curva do rio
em toda a sua eternidade.

Tonho França

31 de mai. de 2010

As minhas faces

As minhas faces

Observo a caixa onde o último charuto descansa
Há uma certa elegância no aroma do Cohiba

Ainda pousa sobre amarelados papéis
a caneta de pena importada
o relógio de bolso em ouro
(ambos herança de meu avô)

já desfiz-me de tudo que era precioso

perdi-me de muitos rostos caros e amigos
e morri um pouco em cada mulher que amei

hoje o tom escuro repousa em quase todas minhas roupas
e meu peito e braços são de cinzas e barro
sou feito de cinzas e barro
e toda essa profusão de sons, cores, pessoas
são estranhas ao meu olhar.

Relembro na pausa de um suspiro (lento)
Toda minha vida
pouca coisa restou de uma época e de mim.

Os últimos poemas ainda insistem na memória
Eles tem a alma, o ritmo e o segredo dos mares

E toda noite, condenam-me veemente
ostentando sobre as ondas, brados revoltos
em espumas claras-intensa-reluzente
A face de todos meus “eus” mortos


Tonho França

20 de mai. de 2010

A morte

A morte em minha casa
Vive no branco da parede
Adornada por azulejos
Brancos e azuis-pálidos
Alimentando-se de mim
Num ritual contínuo e natural
Com o apetite voraz dos ponteiros
Que contemplam vitoriosos
cantando eternos tic-tacs

Tonho França

18 de mai. de 2010

A moça...

A moça ...

Tinha os olhos e cabelos formados por feixes de águas negras e profundas
A pele morena e lisa em tom de terra secular e misteriosa
Lábios finos e doces como o sumo dos morangos
Sua voz era a mesma das deusas e das prostitutas de todos os tempos
E guiava o vôo dos pássaros e o rumo do sol
O vestido de neve rendado por pedras e ervas
cobria o corpo bordado em fios de ouro e pérolas
Era a moça de Santa Cruz de La Sierra
Era a moça de Santa Cruz
Na mão direita estampada a face de vários mortos
E na outra um cajado de lua e estrela
Os seios erguidos apontavam o céu
E amamentavam pequenos anjos que nasciam nas noites de inverno
Não era amante de homem nenhum ou de qualquer criatura
Os pés descalços pisavam o tempo e as promessas
Suas lágrimas banhavam os vales em trigo e vinho
E era do seu sopro que nasciam os sonhos de todos os homens
Por todos os dias e noites num tecer que não se encerra
Era a moça de santa cruz de La sierra
Era a moça de santa cruz
Era a santa
Ela a cruz


Tonho França

17 de jul. de 2008

Sobre noites e poesias...

Tenho nas mãos uma lua, e duas moedas antigas
Brinco de jogar pedrinhas
A noite não me traz nenhuma promessa
Sei onde deixei minhas preciosidades
(Poucas e verdadeiras relíquias _ sentimentos)
E que alcançá-las, não posso mais.
Já não me pertencem

O tempo não é senhor de tudo
O tempo não apaga tudo
Até muda o humor das marés, dos homens
Cercas e soberanias, domínios e propriedades

Envelhece aquilo que lhe é permitido envelhecer

mas há pinturas em minha pele
Há segredos nos meus olhos,
Há muita coisa em meu coração
Intangíveis, por isso minhas
E só minhas são.
E só minhas são.

E com elas, em noites de poeta e poesia
Brinco de jogar pedrinhas
Com duas moedas antigas
E a lua que tenho nas mãos
O tempo?
Que passe!
Por mim - em vão.

Tonho França

9 de jul. de 2008

Caminhos de sol

Eu olho de frente pro sol
as sombras lapidam-se
entre pedras e assovios
mudanças de luas e estações
água calma que veste os rios

e eu sigo de frente pro sol

sei que não conheço as manhãs do futuro
percebo a beleza do improviso,
o vento que toca em meus cabelos longos
É íntimo conhecedor de destinos...

além de mim e do caminho, dentro de mim - caminho
e eu sigo de frente pro sol

nas entrelinhas é que se encontra o que foi dito
sem mapas ou rotas, só sentidos....

cíclica vida
começa, termina
espiral realidade fantasia
metafísica poesia

além de mim e do caminho, dentro de mim o caminho
É preciso olhar de frente pro sol
ser e estar de frente pro sol
ser e estar
Sol.

Tonho França

17 de abr. de 2008

Da América do Sul (abaixo da linha do equador...)

Sei das minhas rotas, e das portas que fechei
Sei das linhas imaginárias que não cruzei
É natural na América do Sul
Abaixo da linha do equador
Eqüidistante em mim, alegria e dor.
É natural sonhar quintais sem cercas ou muros
E não falar inglês
Não tenho paredes, nem flores artificiais
Nada em mim é seguro, sólido, permanente,
Minha alma é tatuada por versos em constante metamorfose
Por isso às vezes, sangro uma tristeza calma,
Aos solos baixo de um violão
Na dança lenta da fumaça
E o coração se fecha um pouco, quase falha
E a lágrima disfarçada brinda o rosto
e se espalha por toda a linha do Equador
Sem muros ou cercas nos quintais
Aos solos do violão
Eu e minha solidão
nada mais.

Tonho França.

Dedicado a Kátia Arruda.

12 de abr. de 2008

O último céu...

luas sangram pétalas de fogo num céu nu
a noite rasga o ventre do infinito – azul

o céu revolto em noite escura, sangrando estrelas nuas
mudando as marés e as rotinas
as constelações sorrindo em insanidade divina
pétalas de luz, ágata-marinha

e como todas as noites, ainda tentamos voltar para casa
tentamos voltar para casa

ondas dançam nas coberturas dos edifícios
rosas nascem nas trincas dos precipícios
e todos os alarmes tocam diferentes notas
a chuva é calma e o vento tem todas as respostas

o vento tem as respostas
the wind has all the answers

não há mais rotas, estradas, a vida de antes
os caminhos de antes, o que éramos antes,
éramos...

hoje o firmamento não trouxe a aurora
agora já estamos em casa
definitivamente em casa...

o vento é que tem todas as respostas.

Tonho França